7 comentários em “Os jovens-ponte | 4 anos depois, 2 meses antes da 2a Conferência Global da Década de Ação pela Segurança Viária”

  1. Não-dualismo? Micro-revoluções? E se não der para “costurar por fora”?
    Excelente contraponto o texto do filósofo Vladimir Safatle, publicado hoje, 09 de agosto, no jornal Folha de São Paulo.

    VLADIMIR SAFATLE

    Maria Antonieta

    Em 2006, a cineasta Sofia Coppola lançou um filme sobre Maria Antonieta. Ao contar a história da rainha juvenil que vivia de festa em festa enquanto o mundo desabava em silêncio, Coppola acabou por falar de sua própria geração.
    Esta mesma que cresceu nos anos 1990.

    No filme, há uma cena premonitória sobre nosso destino. Após acompanharmos a jovem Maria por festas que duravam até a manhã com trilhas de Siouxsie and the Ban- shees, depois de vermos sua felicidade pela descoberta do “glamour” do consumo conspícuo, algo estranho ocorre.

    Maria Antonieta está agora em um balcão diante de uma massa que nunca aparece, da qual apenas ouvimos os gritos confusos. Uma massa sem representação, mas que agora clama por sua cabeça.

    Maria Antonieta está diante do que não deveria ter lugar no filme, ou seja, da Revolução Francesa. Essa massa sem rosto e lugar é normalmente quem faz a história. Ela não estava nas raves, não entrou em nenhuma concept store para procurar o tênis mais stylish. Porém ela tem a força de, com seus gritos surdos, fazer todo esse mundo desabar.

    Talvez valha a pena lembrar disso agora porque quem cresceu nos anos 1990 foi doutrinado para repetir compulsivamente que tal massa não existia mais, que seus gritos nunca seriam mais ouvidos, que estávamos seguros entre uma rave, uma escapada em uma concept store e um emprego de “criativo” na publicidade.

    Para quem cresceu com tal ideia na cabeça, é difícil entender o que 400 mil pessoas fazem nas ruas de Santiago, o que 300 mil pessoas gritam atualmente em Tel Aviv.

    Por trás de palavras de ordem como “educação pública de qualidade e gratuita”, “nós queremos justiça social e um Estado-providência”, “democracia real” ou o impressionante “aqui é o Egito” ouvido (vejam só) em Israel, eles dizem simplesmente: o mundo que conhecemos acabou.

    Enganam-se aqueles que veem em tais palavras apenas a nostalgia de um Estado de bem-estar social que morreu exatamente na passagem dos anos 1980 para 1990.

    Essas milhares de pessoas dizem algo muito mais irrepresentável, a saber, todas as respostas são de novo possíveis, nada tem a garantia de que ficará de pé, estamos dispostos a experimentar algo que ainda não tem nome.

    Nessas horas, vale a lição de Maria Antonieta: aqueles que não percebem o fim de um mundo são destruídos com ele. Há momentos na história em que tudo parece acontecer de maneira muito acelerada.

    Já temos sinais demais de que nosso presente caminha nessa direção. Nada pior do que continuar a agir como se nada de decisivo e novo estivesse acontecendo.

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  2. Fala Eduardo, tudo bem? Suas mensagens são maravilhosas: atuais, criativas, instigantes. Uma ressalva. Meu amigo, quando a conversa esquenta você termina! Isso não é justo! Lembro-me de outro post em que abordava mensagem americana mais ou menos assim: “se você beber e dirigir será preso”. Não há ponte.
    O Brasil tem muitas normas, muitas punições previstas. O próprio CTB é muito detalhista. Não se consegue cumpri-lo na íntegra. Essa questão de que se a norma é desrespeitada constantemente remete para possível revisão de sua formatação é algo a ser pensado. Uma coisa comum, por exemplo, é a insistência em se utilizar o celular ao dirigir. Imagina como isso repercute nas inúmeras realidades Brasil afora?
    Como ele é muito detalhista, a possibilidade de gerar multas é alta. Por suas vez, os valores ds multas também são altos, o poder fiscalizador não tem força política para fazer cumprir o CTB e daí “alivia”. Mesmo porque a população também percebe que parte do discurso fiscalizador esconde outros, que não são republicanos.
    A cultura de segurança no trânsito envolve jovens e não jovens. O grande diferencial dos jovens talvez seja sua mente hiperconectada, o que possibilita a formação e propagação de redes; de aceitação e divulgação de informações, convencimentos, agilidade e capilaridade.
    Voltando ao post anterior, de se trabalhar valores e princípios éticos, acredito também que um grande dificultador seja nossa dificuldade diante de dois itens cada vez mais escassos: o tempo e o espaço. É visível que a cada dia temos menos espaços públicos para compatibilizar tantos interesses pelo seus usos, assim como o tempo de deslocamento altera diretamente com o aumento de veículos nas vias. Discutir ética, valores, segurança quando se trata de bens escassos, o desafio é ainda maior. Temos de encontrar soluções rápidas para desobstruir as ruas e estradas. Precisamos aprofundar mais o entendimento dessas pontes e sermos criativos como você nesse interatividade com os jovens. Parabéns. Grande abraço. Evêncio.

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  3. Oi, Marco!

    Eu terminei por esgotamento! Esse post não foi fácil. Levei quase um mês remoendo o longuíssimo relatório da pesquisa do “Sonho Brasileiro”.

    Insisti em comentar a investigação em um post para que mais pessoas tivessem conhecimento dos resultados e para provocar, como sempre, a acomodação e a apatia que reinam no parco diálogo com esses jovens.

    A pesquisa fareja uma nova tendência entre esses jovens, novos modos de pensar e de agir. Legal. Concordo que há algo novo que vem se consolidando há vários anos; discordo, porém, da interpretação do que é esse “novo” e da euforia deslumbrada com a positividade dessa geração – eu jamais analisaria positivamente essa política da “micro-revolução”. Veja bem as explosões dessa semana em Londres, veja o que vem acontecendo na Síria, no Chile, na Espanha, na Líbia e o que aconteceu no Egito. O micro-revolucionário se revolta contra a sacola plástica mas pode acabar massacrado ou sair correndo se tiver que lutar por qualquer coisa mais importante. Enfim, pensei que a pesquisa merecia o trabalho de peneira e uma reflexao sobre o trânsito.

    Podemos abolir essa frescura de “pontes”, é claro, se tivermos a força de impor a repressão sistemática e rigorosa das condutas, como fazem os norte-americanos. Não temos, no entanto, essa força nem acho que esse é o melhor caminho – certamente não é o único. Eu acho que dependemos desse poder de mobilização em rede dos jovens e da disseminação entre eles de hábitos de segurança, mas não chegaremos até eles sem abrir o debate e reunir argumentos suficientemente convincentes. Não há outra forma de construir a legitimidade da norma com essa galera a não ser pelo diálogo.

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  4. Os adolescentes de hoje “desejam pequeno” ou estarão eles apenas perseguindo um ideal de autocontrole? Esse é o tema do novo artigo de Contardo Calligaris (Folha de São Paulo, 11 de agosto).

    Calligaris manifesta um incômodo que ele vem abordando há vários anos e que emerge imediatamente da leitura da pesquisa do “Sonho Brasileiro”: os jovens hoje parecem sonhar com projetos muito “razoáveis”, se não desanimadores e quase resignados. Na pesquisa da Box, os sonhos dos jovens não são “razoáveis”, porém: são grandes sonhos de transformação pessoal e da sociedade. A política de realização desses sonhos – a micro-revolução – é que é mesquinha e resignada, “cagona” como se dizia antigamente. Para Calligaris não há a idealização de um descontrole (que toda utopia verdadeira engendra) e que embalou, por exemplo, muitos dos sonhos revolucionários dos anos 1960. Hoje, ao contrário, como os vampiros vegetarianos da saga “Crepúsculo”, essa geração parece ter em alta conta a disciplina do desejo, um desejo heroicamente contido num exercício de autocontrole (cuja contraforça é, como vimos, a primazia dos projetos de vida individuais, da formação e da carreira: todos vão bem se eu estiver bem).

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